2.11.06

* encontros e despedidas *














A chuva não estava nos planos, mas deixou a tarde com mais cara de São Paulo, cinema e livros. Por isso, todos tiveram a mesma idéia - e aqui é preciso abrir um parêntese (nunca estive numa Reserva Cultural tão cheia). Cheguei às 15h. A primeira sessão começaria em cinco minutos e, mesmo com a enorme fila, consegui o meu lugar na sala 1. O filme era uma das estréias do feriado: O ano em que Meus Pais Saíram de Férias, do diretor Cao Hamburguer.

1970. México, Copa do Mundo. No Brasil, ditadura militar. Mas, diferentemente do que possa parecer, a produção brasileira não é mais uma sobre futebol e/ou repressão. Vai além. O encantamento não está nos passes de Tostão para Pelé, e a dor não é escancarada nas salas de tortura do Doi-Codi. Os protagonistas não são os craques do futebol, nem os estudantes e militares. Mauro e os botões do futebol conduzem a história da comunidade paulistana do Bom Retiro. Mineiro de Belo Horizonte que vem para São Paulo, o garoto de 12 anos, olhos verdes apaixonados por dribles, não deixa a atenção fugir de cada um de seus movimentos - como se algum pozinho, o de pirlimpimpim talvez, tivesse se espalhado pelo ar nos impedindo de pensar em outra coisa que não esteja dentro daquela história. O pequeno garoto - ator de primeira viagem, como foi dito por aí - carrega a alma do filme. Nele é possível reconhecer todo sofrimento e alegria de um ano contraditório para o país verde-amarelo. Um ano em que desespero e esperança caminharam juntos - para Mauro, com mais intensidade.

Ele não foi escolhido por acaso, acredito. As crianças têm o incrível dom - que com o passar dos anos é deixado de lado - de serem sinceras. Não só nas falas, mas nos gestos e olhares. Talvez, por esse motivo, nem foi preciso mostrar bombas de ferimentos e bombas de entusiasmo. O pequeno Mauro era o movimento e a magnitude daquele ano que, para ele, foi de conquistas indestrutíveis: amigos, amores e carinhos. Bastavam e bastariam, se os desencontros não existissem sempre pela vida...

O filme terminou é só ficou a sensação de que é mesmo preciso mudar e recomeçar para nos darmos conta do quão importante foi o que passou. É preciso sempre carregar pedacinhos das pessoas que estiveram em nosso caminho. É preciso lembrar da infância para não deixar que os sentimentos e desejos ingênuos sejam perdidos. Foi isso também o que senti quando terminou a segunda sessão do dia. Na sala 4, da mesma Reserva Cultural, um carinho no coração que trariam lágrimas simultâneas de emoção e felicidade: Pequena Miss Sunshine.

Diferentemente do que o trailer nos levava a imaginar, a produção não é mais uma bobinha comédia norte-americana. Mais uma vez, o desejo de criança escancara as fraquezas e os medos do mundo dos adultos. Uma história que nos permite entrar em contato com tudo que deixamos de lado por conta de um (involuntário talvez) egoísmo. Crescemos e acreditamos na independência. Nos tornamos auto-suficientes. Aprendemos a fazer tudo sozinhos e, bobinhos, confiamos na certeza de que ninguém, além de nós mesmos, é mais importante no mundo. Besteira.

Hoje, depois de um dia sozinha, no meio de tanta gente, tive a certeza de que de nada adianta enfrentarmos o mundo sem que os outros existam. Neles estão a nossa motivação e explicação para estarmos por aqui. Pequena Miss Sunshine foi responsável por me trazer de volta aquela leveza que há um tempo tinha sumido do corpo e da mente. A pequenina Olive provou que estar juntinho e bem pertinho das pessoas que amamos é lindo. E só isso já explica o desejo constante por mais reencontros, e menos despedidas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Oi, Thais, ainda não vi nenhum desses filmes, mas estou ficando cada vez mais entusiasmada para vê-los. Pela sua descrição, imagino que vou gostar deles; esses assim, delicados, que nos deixam um pouquinho de si, como um leve perfume que fica depois do abraço...

Anônimo disse...

Só vi o "ano em que.." e é relamente sensacional. O outro "pequena miss.."me foi bem recomendado.

Filmes que marcam. Fimes-vida